O juiz Bernardo Antônio de Lacerda, da 6ª Vara Mista da Comarca de Sousa, Sertão paraibano, proferiu sentença que estabelece ao Governo do Estado da Paraíba o pagamento de um multa coercitiva que atingirá o teto de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), além de honorários de sucumbência, por não ter fornecido um cuidador especializado a uma aluna autista, expondo-a a graves riscos dentro e fora da Escola Estadual de Ensino Fundamental Manoel Mendes, localizada na cidade de Nazarezinho, região de Sousa.
A decisão, proferida nesta terça-feira (02), atende a uma Ação de Obrigação de Fazer movida pela família da menor, que possui Transtorno do Espectro Autista (TEA) em forma grave, associado a Retardo Mental. A identidade da aluna de 16 anos de idade será preservada em respeito à sua privacidade.
A sentença judicial é explícita ao descrever a omissão do Estado e os perigos a que a adolescente foi submetida devido à falta de acompanhamento profissional. Entre os fatos gravíssimos que embasaram a decisão, estão:
Risco de afogamento: o episódio em que a aluna foi encontrada desacompanhada nas dependências da Escola Manoel Mendes, dentro de um recipiente com água.
Aluna perdida: relatos recentes de que a menor foi encontrada vagando sozinha no centro da cidade após ter se afastado da escola sem o devido acompanhamento.
Exposição e abandono: a situação de ser deixada por longos períodos no chão quente de cimento da escola e retornar para casa sem as vestimentas íntimas, evidenciando um quadro de negligência intolerável.

Indenização e multa por desobediência contumaz
A Justiça não apenas determinou a obrigatoriedade imediata de fornecer um profissional de apoio escolar (psicólogo, psicopedagogo ou terapeuta ocupacional com formação em assistente terapêutico escolar), mas também impôs sanções severas pelo descumprimento reiterado da ordem judicial, que se arrastava desde maio de 2025.
O Estado da Paraíba já vinha sendo multado, mas a recalcitrância (resistência em obedecer) levou o magistrado a ampliar a multa diária (astreintes) para R$ 3.000,00 (três mil reais). O valor acumulado dessa multa foi limitado, por ora, a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), que deverá ser revertido ao Fundo Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, com destinação exclusiva para programas de apoio à educação inclusiva de alunos com TEA.
O magistrado rejeitou categoricamente as alegações do Estado de “separação de poderes” e “reserva do possível” (limitações orçamentárias), afirmando que a garantia do direito fundamental à educação inclusiva e à segurança de uma menor de idade com deficiência se sobrepõe a tais justificativas.
“A intervenção judicial, neste caso, não representa uma substituição do mérito administrativo, mas sim o exigível controle de legalidade e constitucionalidade da omissão administrativa, que ao negar um serviço essencial e legalmente previsto, se torna uma omissão inconstitucional,” afirmou o juiz na fundamentação da sentença.

Reação da defesa da aluna
A defesa da família da adolescente reforçou que é dever do poder público assegurar recursos e adaptações para estudantes com deficiência.
“Essa sentença representa não apenas a proteção de um direito individual, mas um avanço importante na luta por uma educação verdadeiramente inclusiva”, disse o advogado Francisco de Assis Gomes de Sousa Júnior.
A decisão vai além da esfera cível. O juiz determinou o “envio de cópia integral” do processo ao Ministério Público da Paraíba (MPPB) para que sejam apuradas as providências cíveis e criminais cabíveis contra os gestores e agentes públicos responsáveis pelo descumprimento grave e reiterado da ordem judicial, o que pode configurar ato de improbidade administrativa.
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